Como complemento do que escrevemos sobre o grande poeta nosso conterrâneo,em anterior post, gostariamos de partilhar uma écloga que escreveu na década de 80 do século XVIII, e no qual "canta" o Rio de Mouro, termo da Vila de Sintra.
PRIMAVERA
Ecloga VI - Alfeno e Frondoso
Agora que a viçosa Primavera
alcatifa de flores as campinas
e enrosca aos ulmos a flexível hera;
Te não sentas aqui,caro Frondoso
junto ás águas do Mouro cristalinas?
vê no roixo oriente o sol formoso
por entre as rotas nuvens chamejando
rasgar a noite o manto azul pomposo
vê os pinheiros surdos sussurando
Os zefiros brincões, e desta fonte
as prateadas linfas encrespando
verdeja em torno o bosque,o vale e o monte
serena a manhã vem,nem denegrindo
estão as grossas nuvens o horizonte
Quando o sol mais ardente subindo
desta faia as Napeias* consagrada
amena sombra está sempre caindo
entrega Melibeu tua manada
ou por esta ribeira à minha unida
irá pascendo a grama rosciada
tudo aqui a recreio te convida
o rio murmurando,e prado hervoso
que a mão remoça da estação florida.
Um sugestivo poema que retrata o caracter campestre que dominava os nossos sítios no século XVIII,e onde na actualidade se conservam muitos vestígios,nomeadamente, bosquetes de pinheiros mansos, e numerosos ulmeiros na margem do rio Mouro.Sem dúvida um dos belos rincões do Ocidente Português.
No século XVIII surgiu em Portugal uma corrente poética, cujos cultores se constituíram numa espécie de "tertúlia" ou "academia", à qual pertenceram vultos destacados da cultura de então, que além do seu nome, assinavam os seus trabalhos com um pseudónimo, alguns deles foram:
José Agostinho Macedo - (Elmano Tagídeo); Joaquim Binge - (Francélio Vouguense); Ferraz de Campos - (Alcino Lisbonense); Bocage - (Elmano Sadino); Curvo Semedo - (Belmiro Transtagano). Deste movimento também fez parte um nosso conterrâneo, Domingos Maximiano Torres, que se diz ter nascido em 6 de Fevereiro de 1748, mas na realidade, segundo apuramos, o dia do nascimento foi 4 de Agosto do mesmo ano. Faleceu no Forte da Trafaria, onde estava preso por delito de opinião, em 1810. O local do seu nascimento vamos revela-lo em primeira mão: Quinta de Entrevinhas Freguesia de Rio de Mouro, Concelho de Sintra, claro que espero que quem se sirva desta informação cite esta fonte, pois há gente que utiliza o que escrevo sem referir o autor.
Voltando ao nosso Arcade, e para surpresa de muitos "famosos" da nossa praça que usam do acinte e do seu "poiso" para denegrir o território onde escolhemos viver e do qual gostamos muito. Domingos Torres - (Alfeno Cynthio) oriundo de uma família abastada, obteve o grau de Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra. Na sua obra poética refere muitas vezes o encanto bucólico de Rio de Mouro., exemplo disso, o soneto dedicado a Dona Joana Isabel Forjaz, e que termina assim:
Já grata em teu louvar a voz se apura
já para ouvir-me o Mouro* ergue a limosa
Fronte azul, entre os freixos não murmura
* Para não restarem dúvidas o editor esclareceu: "Mouro= Rio de Mouro, ribeiro conhecido que nasce três léguas diante de Lisboa, para as bandas de Cintra cuja estrada atravessa por baixo de uma espaçosa ponte, dando o seu nome a um INSIGNE LUGAR pelas suas amenas e grandiosas quintas".
É caso para dizer aos que fazem "humor" de gosto duvidoso, e intelectualmente pobre, venham lavar-se nas águas do Mouro, que são límpidas e talvez como nós e o ilustre arcade se rendam ao encanto deste idílico recanto do termo de Sintra, e deixem de dizer "sujeiras".