A via ferroviária com maior numero de passageiros de Portugal, a linha de Sintra, liga a estação do Rossio na baixa de Lisboa à vila de Sintra, atravessando na parte inicial um túnel, que antes da electrificação nos anos 50 do século XX, era um pesadelo para os passageiros devido ao fumo e fagulhas das maquinas dos comboios. Talvez por esse facto, inicialmente o traçado da linha foi projectado para ser outro.
Sucintamente previa-se:
"O Caminho de Ferro de Lisboa a Cintra partindo dum ponto fronteiro ao forte de S.Paulo, segue pela margem do Tejo até Caxias, continua pelos vales de Laveiras, Rio de Mouro e Lourel e termina em um ponto intermédio ao cemitério de Cintra, e a quinta do Duque de Palmela, percorrendo a extensão total de 28,760 Km." Isto em 1855.
A obra iniciou-se chegando a Caxias, porque os moradores dos sítios de Algés S.José de Ribamar, Dafundo e Cruz Quebrada se queixaram as autoridades, em Março de 1857 das águas estagnadas na praia entre este último ponto e Belém em virtude das obras do caminho de ferro de Lisboa a Cintra, iniciadas em 1855 e, pediam providências para se evitarem males que podiam resultar daquele facto.
O caminho de ferro para Sintra com o traçado actual foi inaugurado em 1887. As obras realizadas até Caxias foram depois aproveitadas para o caminho de ferro de Cascais. O sitio fronteiro ao Forte de S Paulo coincide, actualmente com a estacão ferroviária do Cais do Sodré, em Lisboa. As "voltas" que este empreendimento deu...
Quem se deslocar de Sintra para Montelavar ou Pêro Pinheiro, utilizando estrada nacional 9 (EN9), um pouco adiante do cruzamento de Campo Raso, no final duma longa recta encontra uma rotunda, onde sai a via para Vila Verde. Esse local chama-se Fervença.
Uns escassos metros,passando a mesma. deparamos uma ponte sobre o curso de água que drena os pântanos que antigamente existiam na Quinta da Granja, chamada do Marquês por ter sido propriedade do 1º Marquês de Pombal, onde hoje é a Base Aérea nº1.
Este regato apesar de ter reduzido caudal no verão é perene, no inverno a corrente toma volume razoável.Deslizando sob a ponte o ribeiro precipita-se encosta abaixo na direcção da Ribeira da Cabrela, o solo do seu leito é pedregoso assim, as águas formam pequenas ondas brancas, transformam-se em cachoeira, quando o declive se acentua.
Segundo o dicionário Houaiss da língua Portuguesa, o prefixo "ferv" pode significar: borbulhar, estar agitado... Na língua galega fervença designa rápido de rio ou ribeiro. Em português, ainda de acordo com o citado dicionário, fervença quer dizer grande agitação.
Assim, consequência deste ribeiro ser de águas agitadas cuja cachoeira é testemunho, originou que ao sítio se atribuisse o nome FERVENÇA. Um topónimo singular. A "leitura" da paisagem continua uma fonte de conhecimento.
Poderíamos começar este apontamento, como se fosse uma antiga crónica: neste ano da graça de 2012, de acordo com os dados do organismo responsável pelo acompanhamento da situação meteorológica, grande parte do território de Portugal, encontra-se em situação de seca severa. Não admira a maioria dos Portugueses já se tinha apercebido que devido à incompetência e inépcia das apelidadas "elites" dirigentes, estamos como se diz na gíria "NUMA SECA". Vai daí e para amenizar o entorno resolvemos escrever sobre um facto do passado da nossa região quase inédito: a importância piscatória do litoral de Sintra.
Quando 2007 iniciamos este nosso diálogo com os leitores, deparamos com comentários, um pouco entre o jocoso e o condescendente, augurando falta de interesse de eventuais visitantes e depressa iríamos "desaparecer", no entanto, tal não sucedeu este "sítio", vai acrescentando factos menos conhecidos sobre a ponta mais ocidental da Europa,que esperamos sejam do agrado,de quem nos lê.
Além da reconhecida aptidão agrícola do solo,a região de Sintra, em finais do século XIX princípios do XX, albergava nas águas do Oceano Atlântico que banha a sua costa, abundantes cardumes de espécies piscatórias, nomeadamente sardinhas. A pesca fazia-se instalando armações, com copo "à valenciana". Este método constava de um aparelho fixo formado por um conjunto de redes, cabos ferros e embarcações de uso do mesmo aparelho. As armações começavam a faina em 20 de Abril, o levantamento efectuava-se até 30 de Setembro. A colocação destes aparelhos era feita a 4000 metros de terra, em águas de profundidade até 15 braças, cerca de 30 metros, deviam dispor de sinalização adequada, em dias de nevoeiro à sinalética habitual deveria acrescentar-se a sonora através de buzina, de noite era obrigatória a utilização de luminárias, tudo para impedir o abalroamento por embarcações.
Na região de Sintra/Cascais existiam,em1904, duas armações, cujas distâncias angulares em terra,necessárias á sua localização, eram para a primeira: Farol da Roca à Peninha, Peninha à Bateria Alta, Peninha à Bateria do Guincho, enfiada da igreja da Areia á Peninha, um pouco á direita do grupo de casas da Figueira do Guincho. A descrição corresponde á zona do Cabo Raso ao Cabo da Roca.Estava concessionada á sociedade Galambas & Pessoa. A segunda tinha como pontos de referência em terra S. Julião. O Cabo da Roca, e enfiamento com o Palácio da Pena. Ou seja,entre o Cabo da Roca, Foz do Lizandro;propriedade da Companhia de Pescaria Ericeirense.
A pesca era abundante; os fortes das Azenhas do Mar e do Magoito, funcionavam como entrepostos fiscais da actividade (lotas). Os pesqueiros estavam próximos dos consumidores quando as"varinas" poisavam as canastras para a venda, a sardinha apresentava o aspecto reluzente da pesca recente, o pregão das vendedeiras na região da grande Lisboa foi durante décadas "SARDINHA Ó VIVA DA COSTA". Na verdade, era mesmo capturada na costa. Em pouco mais de cem anos a sardinha quase desapareceu do nosso mar. Ainda no recente período dos Santos Populares, atingiu preços proibitivos. Um peixe que os nossos trisavôs practicamente, apanhavam à mão nas praias entre o Guincho e a Ericeira. Alguma coisa se passou aqui, dá que pensar... No entanto, em questão de novidades, tivemos uma boa pescaria!? Oxalá.
Quando no apontamento que escrevemos acerca do Rio dos Veados, referimos a azenha da Louceira a propósito dum acidente ocorrido na zona durante o século XVIII, do qual resultou o afogamento do moleiro da "moenda";desta restam umas ruínas na margem esquerda do curso de água, no entanto, das obras hidráulicas realizadas para permitir conduzir o caudal necessário a movimentação das mós ainda é possível observar um açude implantado no leito do rio.
Curiosamente esta construção está situada num local onde confluem os limites dos concelhos de Sintra, Oeiras, e Cascais e também os das freguesias de Rio de Mouro, Porto Salvo e S. Domingos de Rana. A partir daqui o ribeiro passa a denominar-se Ribeira da Lage, tomando o nome do povoado um pouco abaixo na direcção da foz.
Relembremos que se dá o nome de açude "a uma construção de terra, pedra, cimento, etc. destinada a represar águas a fim de que sejam usadas na geração de força, na agricultura ou no abastecimento, pode também, designar-se por represa". O da Louceira é de pedra e está bem preservado, como se observa na foto.
Pela envolvente e localização seria um sítio ideal, para construindo uma ponte pedonal, integrada nos caminhos adjacentes, possibilitar a abertura de um percurso para caminhadas,não só estreitando as relações de vizinhança dos moradores das redondezas, mas também observar o açude. Daqui lançamos um apelo aos Presidentes das Juntas de Freguesia citadas, para que em conjunto estudem a melhor solução para que o AÇUDE DA LOUCEIRA, possa ser visitado, trata-se duma queda de agua que parece impossível,mas existe bem no centro dos três concelhos mais urbanizados de Portugal. Oxalá, um dia seja uma realidade este desejo.
A administração local,considerada como um conjunto de entidades cuja função principal é exercer o poder político numa determinada circunscrição administrativa,tem sido descrita em Portugal,desde tempos recuados,numa perspectiva que,porventura ,alimentou no imaginário nacional a ideia de que sendo uma emanação dos usos e direitos consignados nos forais representava a forma de governo mais adequada à resolução dos problemas das populações e ao fomento do desenvovimento das comunidades ,Fernandes(2010,p.17)
Na prática o povo era tido em pouca monta quando se tratava de tomar decisões,algumas das quais ,por certo, nem sonhava.Agora que devido ao programa de resgate da dívida pública, se irá discutir a questão de extinguir, ou não, Juntas de Freguesia e Câmaras Municipais deixamos,como curiosidade,um exemplo que se passou em 1840.Naquele ano foi apresentado no Parlamento o seguinte:
Requerimento das Câmaras Municipais dos concelhos de CASCAIS e OEIRAS,que pedem a extinção destes concelhos e a sua anexação ao de Lisboa; e dos habitantes da Freguesia de Almargem do Bispo que pretendem ser desanexados do concelho de Sintra,e unidos ao de Lisboa.
O povo teria conhecimento desta iniciativa,que não resultou?.No entanto demonstra, que a elite dirigente considerava que as autarquias referidas não tinham viabilidade como poder autónomo e sim vantagem em juntar-se ao Município da Capital do Reino.Curioso , para meditar nos tempos que aí virão...
O curso de água que nasce na serra de Ouressa nas proximidades de Mem-Martins, e que desagua no Rio Tejo em Santo Amaro de Oeiras, era conhecido, consoante os sítios por donde passa. No seu percurso fazia mover várias Azenhas e uma Fábrica de Estamparia, a qual foi objecto dum estudo de nossa autoria, publicado na revista SINTRIA I-II (1982-1983), a fábrica foi demolida e aquele trabalho é testemunho importante para o conhecimento da "Real Fábrica de Rio de Mouro" fundada em 1790, por Joaquim da Silva.
Voltando à ribeira, esta depois da povoação de Francos onde existia uma Azenha de duas mós, inflecte na direcção de Asfamil, antes de chegar ao sopé desta povoação, era conhecida como RIO DOS VEADOS, pela mesma razão dos "gamolares" da vila de Sintra de que falamos a propósito da origem do topónimo Galamares.
No século XVIII ainda existia o povoado. Devia ser de fundação remota. Fomos em busca de vestígios que porventura tivessem ficado, da aldeia só existe a memória que os habitantes das redondezas conservam.
Em consequência duma grande cheia ocorrida há alguns anos o leito do rio modificou-se na confluência com a Regueira de Asfamil. As "passadouras" de pedra foram destruidas, assim como a inscrição que lembrava um episódio ali ocorrido,por isso deixamos o texto publicado no "Memorial de Oeiras" (1860):
Em os 23 de Novembro de 1793 Assoccedeo por causa da cheia ser grande afogar-se
neste rio Vital Prodêncio.P.N.A.M.
O protagonista deste trágico acontecimento era moleiro da azenha cujas ruínas se encontram um pouco abaixo no lugar da Louceira. Este trecho da ribeira é de grande beleza, sendo um dos mais recôndidos locais do Concelho de Sintra, que aqui faz fronteira com o de Cascais. Custa a acreditar que estamos a 20 km do centro de Lisboa. Sem dúvida que para quem gosta da natureza e dos seus encantos um passeio para admirar o RIO DOS VEADOS, merece uma "caçada".