O Dr. Manuel Hermenegildo Lourinho (1891-1979), médico, deputado na Assembleia Nacional do Estado Novo em 1952, a propósito dos acidentes rodoviários, e falta de civismo na condução, "pragas" já ao tempo, proferiu um discurso, no qual, como exemplo apontou o que se passava numa rodovia do concelho de Sintra. O Dr. Lourinho, gozava as férias de Verão no Município sintrense, apesar de ser natural de Portalegre, a intervenção é uma "pérola" que gostosamente partilhamos:
"Quem, num domingo de Verão, por volta das 16 horas, se colocar como observador nalguns pontos da estrada Sintra-Praia das Maçãs, para verificar o que ocorre na sua pouco mais do que meia polegada de largura, diagnosticará facilmente, mas com êxito absoluto, o complexo perturbador que acabo de apresentar aos senhores deputados.
São os automobilistas de verdes anos, que irrompem como furacões, torneando a estrada de lés a lés; é o motorista desembaraçadissimo de presunção, mas falho de dotes físicos para bem conduzir; são os que fazem ultrapassagens de risco, em que os pneus cantam e o pavimento fica com profundos arranhões; são os grandes camiões de carga rolando a reboque, ocupando,pelo tamanho e pelo exagerado volume da mercadoria a transportar, todo o espaço que se encontra para distribuir pelos outros; são os condutores tímidos e mal preparados para conduzir um veículo, incapazes, de seu natural, para resolver qualquer problema dos muitos que continuamente aparecem a quem conduz na estrada.
E mais são os motoristas que apenas medem e reclamam os seus direitos, esquecendo ou desconhecendo os seus deveres.
Ainda pior, são os peões que num rancor invejoso contra os que conduzem os motorizados, se supõem e se mantêm no direito de ocupar e se demorar na porção de faixa de rolamento pertencente ao motorista.
Ainda mais, são os pais descuidados os imprevidentes, que deixam sem vigilância as crianças cruzarem os caminhos destinados para o trânsito de velocidade.
São os "loucos da estrada" todos os que acabei de enumerar". O deputado, incluído na ala republicana da Assembleia, para resolução do problema propunha: "tornem-se mais duras as sanções. Faça-se policiamento menos burocrático e mais educativo.
Modifiquem-se as provas de exame de competência para condutores de motorizados em ordem a menos mecânica inútil e falaciosa e a mais textos de carácter. Façam-se exames somático-neurológicos rigorosos. Apresentem-se aos condutores textos para avaliação das faculdades físicas de reacção. Submetam-se os candidatos a provas de agudeza dos sentidos. Responsabilizem-se os peões".
Não se poderá dizer, das propostas do ilustre deputado da ditadura, que sejam antiquadas ainda hoje têm modernidade evidente. Um pedaço de prosa caustico e bem urdido. O Português, quando desfruta da possibilidade de conduzir um veículo automóvel, na maioria dos casos, entra num estado de euforia, natural ou "induzida", comportando-se como piloto de corridas. A "fama" pelo visto, "já vem de longe", como na antiga publicidade a uma bebida alcoólica. Ou talvez por isso...
Na estrada entre OLELAS e ALMARGEM no Concelho de Sintra, um pouco adiante do cruzamento, para acesso a primeira daquelas povoações, no lado direito da via para quem vem do SABUGO, está um vistoso LOUREIRO, no qual os apressados condutores utentes da estrada nem reparam.
O loureiro é um arbusto de sítios húmidos, quando encontra condições propícias cresce rapidamente, atingindo proporções de árvore dalgum porte. O loureiro mesmo no Inverno tem as folhas sempre verdes. São lhe atribuídas propriedades medicinais e gastronómicas bastante conhecidas. No tempo dos Romanos das suas folhas faziam-se coroas para premiar os heróis. Ainda hoje quando alguém obtém uma distinção diz-se: "Foi laureado".
As folhas do loureiro, segundo antigas crenças, tinham o poder de afastar os relampagos. Em algumas regiões do Portugal rural queimam-se ramos de loureiro benzidos, Domingo de Ramos, para se afastarem as trovoadas. Ao loureiro eram atribuídas pelos camponeses o poder de afastar as forças maléficas que podiam prejudicar as colheitas.
Terá sido por isso que o proprietário das terras onde este LOUREIRO cresce o terá plantado na extrema da mesma junto a um pequeno curso de água? As árvores são uma fonte de beleza e de ensinamentos. As pitonisas gregas queimavam os ramos de louro antes de proferirem as suas profecias porque atribuíam ao loureiro poderes divinatórios.
Muitos dos problemas actuais talvez se devam à incultura dos dirigentes dos POVOS...
Não seria descabido inspirarem-se-no simbolismo do loureiro que os antigos associavam, ao espírito da superação das dificuldades, à sabedoria e finalmente à vitória...
Quem diria que um solitário LOUREIRO da berma duma estrada pudesse guiar-nos até AQUI!
O carácter rural que durante séculos caracterizou as cercanias de Lisboa, deixou na toponímia marcas irrefutáveis. A pouco mais de 15 km do centro da capital, é possível encontrar sítios com relação directa a tarefas decorrentes da actividade agricola. No concelho de Sintra, junto a antiga estrada nacional, um pouco adiante da conhecida curva da CASA DOS VASOS, encontramos a direitaum caminho com a designação SERVENTIA DA AZENHA.
Esta via permitia o acesso a uma das várias AZENHAS movidas pelas águas daRibeira da Lage. Este engenho tinha uma mó, e a água motora da roda da azenha era conduzida através duma levada, construída ao longo da ribeira desde uma represa existente na Quinta da Presa (ou represa), situada no caminho entre RIO DE MOURO e as MERCÊS. É uma distância considerável, por isso a queda proporcionava uma força motriz, suficiente para movimentar a AZENHA mesmo com caudais reduzidos.
Como o trigo abundava na região a AZENHA deveria ser muito utilizada.
Ainda hoje observando o carreiro não é difícil imaginar o moleiro tocando o burro carregando os sacos de "pão" para moer...
É curioso notar que o termo Azenha é mais utilizado na zona sul de Portugal, no norte normalmente emprega-se o vocábulo MOÍNHO, como demonstrou o ilustre Professor L.CINTRA. Mais um motivo de interesse, porque deste modo estamos num local de transição entre o NORTE e o SUL de PORTUGAL. OUTRA singularidade deste, OCIDENTE.
A estrada que substituiu o caminho dos almocreves entre Belas e Sintra foi construída no século XIX com o traçado actual. O percurso partindo de Belas, passa pela Idanha, a via atravessava aquela povoação, formando as temíveis "curvas da morte", onde todos os automobilistas receavam circular dada a frequência de colisões graves ali ocorridas. Felizmente a estrada foi rectificada, das curvas ficou a memória. Prosseguindo alcança a Venda Seca, o Quartel da Carregueira, a Tala e o Recoveiro, cruzamento do caminho para Telhal.
Quem circula pela estrada nem imagina que, antes de chegar à bifurcação referida, transita sobre uma interessante ponte de cantaria, sob a qual correm as águas da ribeira de Vale de Lobos que um pouco adiante, quando entra na Quinta Grande, se passa a chamar Ribeira das Jardas. A ponte do Recoveiro com o seu elegante arco rematado de pedra tosca, aqui fica para conhecimento.
Como estamos em ambiente de algum bucolismo, talvez seja apropriado explicar o significado do topónimo IDANHA.
IDANHA: Quer dizer terreno inculto que se arroteia para cultivo. Belas, estava rodeada de quintas e grandes florestas por isso, aos seus moradores não restava outra alternativa senão, aproveitar o matagal ou idanha, para cultivarem o seu Pão, nome que o povo dava ao trigo .
As pontes também devem servir de passagem para o conhecimento, desse modo cumprem a dupla função, de unir margens e saberes...
Nas estradas que servem a Cidade de Sintra foram colocados no século XIX marcos quilométricos indicativos da distancia de "CINTRA" a Lisboa. Restam alguns exemplares. Conhecemos um no Jardim 25 de Abril em Belas em frente à sede da Junta de Freguesia. Outro está na Rua Cupertino Ribeiro em Rio de Mouro Velho.
Já deveriam ter sido retirados e substituídos por réplicas pois correm o risco de poderem ser destruídos, por qualquer acidente de tráfego ou, simplesmente, por desleixo próprio de quem tem ousada incultura.
Se este reparo pode pode parecer alarmista, deixamos aqui o exemplo do triste fim dum marco existente na estrada de Belas a Vale de Lobos um pouco antes da localidade da Serração. Acabou num recanto escondido da berma, mutilado por causa do descuido de quem devia cuidar do património e a incúria dos que ao executarem trabalho só pensam em arrasar tudo.